Creio que inventei que meu avô morreu engasgado com uma espinha de peixe. Acreditei nisso por muito tempo, mas soube, recentemente, que sofria do coração. Inventei também que o estádio da Fonte Nova desabou. Na verdade ouve uma ameaça, um corre-corre, meus irmãos estavam lá dentro e Samuel chegou em casa com os joelhos ensangüentados. Talvez tenha ouvido falar que iria desabar e a imagem simplesmente grudou em minha mente ao ponto de poder quase jurar ter visto acontecer. Sempre pensei nisso e no cuidado com as espinhas de peixe.
Meu avô surge e escapa da minha memória como se não o visse entrar ou sair. Lembro-me de acordar certa vez pela manhã e encontrar chocolates sob o travesseiro. Fiquei de pé na cama e vi vovô lá em baixo, ao lado da banca de jornal, esperando um aceno meu. Lembro da expectativa de vê-lo naquele lugar, o que indica, talvez, que tenha feito isso outras vezes. Não recordo exatamente. A verdade é que lembro mais dos seus passarinhos do que dele. As cenas em minha memória em que ele, de fato, aparece, são pouquíssimas, o que me impressiona mais a respeito do que alimento por essas imagens. Sinto por ele uma ternura e identificação incríveis e hoje, como pai, são seguramente seu amor, caráter e atenção que mais imito.
Um comentário:
Eu tive um avô que criava passarinhos! Lembro, também mais dos viveiros, do que dele! Era meu padrinho. Quando morreu eu era muito pequeno! Mas com certeza esses pequenos gestos ( chocolate, acenos ) ficam para toda vida!
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